quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Lua

O tamanho exato que tem a lua

Eu medi nos olhos apagados

Que o mendigo mais cansado abriu

Só para ver o céu ir embora


Sei que mede mais que uma pupila

E hora ou outra trepida e alaga

Enche duma lágrima salgada

Que eu imagino por fome


E a lua se mantém exata

Inabalada, sustentada no negrume

Num pretume ensurdecedor

Que não diz nenhuma palavra


Ai dá uma ou duas respiradas

Coisa profunda, que enche o peito

Bonito como cinema

Parecia coisa gravada, até bati palmas


E morreu, obviamente fechando a lua

Escondendo entre pálpebras a noite mais linda

O céu menos estrelado, porém mais luado

E me sobrou um corpo estendido, reapagado



Ps.: Um convite pra todos vcs... http://abreparenteses.blogspot.com/ ... e boas festas povo!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Margarida e Oliveira

        O sol escondia-se na Pedra do Cachorro e a Voz do Brasil saía do radinho na janela aberta.

        Oliveira xingava políticos, reclamava do salário mínimo e comentava o resultado da última safra de arroz. Ele falava, falava... Mudava de posição na cadeira de palha. Ela não respondia. Nem balançava a cabeça, nem resmungava um simples “aham” entre suas esperançosas pausas. Talvez os assuntos não a interessassem, talvez o próprio Oliveira não a interessasse.

        Se fosse outra pessoa, ficaria com muita raiva, mas ele não, Oliveira era paciente e vivido. Além disso, não se incomodava com pouca coisa. E mesmo aquele monólogo o entretinha.

       Oliveira aos seus oitenta e poucos anos, sentado na varanda do asilo, conversava com uma planta, como quem conversa com gente. E a margarida olhava-o com uma expressão de tristeza, já sem uma pétala, parecia não entender o que aquele homem de meias compridas tanto falava.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Jogo de cintura

      O casal atravessou o círculo que se formou ao redor do salão e parou no centro. Ambos sem dizer nada, juntaram as mãos levantando o ombro e mantendo a postura reta em posição de dança, num gesto automático.
- Vamos, dê o primeiro passo amor!
- Por quê eu?
- Porque você é o homem, horas.
- Como assim?
- Você vai ficar parado aqui por muito tempo?
- Não é você que vive falando em direitos iguais? Este papo todo de feminismo, que as mulheres estão modernas, conquistando seu espaço no mercado de trabalho e na socie...
- Amor, dá um tempo né! Agora não é hora pra isso.
- Então, as damas primeiro…
         A música já estava tocando há alguns minutos, impaciente e envergonhada ela resmungou um “tá bom” e começou a dança. Entre os passos e rodopios do casal, o homem alto exibia um sorriso camuflado no canto da boca.

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