quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Verde bandeira

Colo adesivos nas paredes
Do estômago
E regenero os exageros
Da noite passada
Meu DNA denuncia
Na minha expressão de poker
Tenho azar no jogo
E penso em ti

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Mais estranha do que as sensações estranhas normais. Girar e girar, subir e descer, sem chegar a lugar algum. Vertigem de carrossel na cabeça de meia criança inteira. Arrepio numa ferida viva. Cicatriz amarela de uma tarde nublada. Música de uma história que não se quer contar. Alguém querido e, vento. Muito vento no embaraçar de cachos virgens, de uma apatia escondida atrás da orelha no ranger do velho. Não poder conter-se e restar apenas chorar. Lágrimas coloridas. Algo difícil. Uma queimação no dedo mingo do pé. Estar livre. Sentir-se assim, leve. Naquele curto espaço de tempo, instantes mágicos, onde nada pode abalar, onde a vida é bela. Fechar os olhos, estar segura. Não ter medo, nem nada.
Luiza Cerávolo

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O calo

Tenho um calo
Permanente
No dedo médio.
Culpa do lápis
E do coração inquieto.
Na verdade,
Desde criança,
Acho bonito
O dedo deformado.

terça-feira, 13 de outubro de 2009




A vida custa-lhe a morte. A estrela torna-se um profundo escuro e, de olhos abertos, cegueira, sufocando-se, cegueira. No paralelo, o mar espuma-se branco num falso reflexo, ao som que a mouca escuta atenta. Gritar não é o suficiente na retórica dos mudos, por isso, canta na tela branca da mente, mais lembrança do que existência. Tenta uma lágrima que se desfaz na própria origem para o mundo. Não sente o vento. Respira água. Cospe sangue. Seus tecidos secam. Seus lábios são silenciados por um frio salgado. Suas pálpebras fechadas para eternidade num derradeiro ralar da pele. Cócegas nas maçãs do rosto. Cabelos como ondas entre bolhas de ar. Uma súplica por um suspiro. A dor inevitável e um último badalo do coração nos ouvidos. A noite brilha mais que o dia e, a morte levanta-se para dançar.



Luiza Cerávolo

domingo, 11 de outubro de 2009

22 gatos pretos

O que seria do café da esquina, sem meus lábios magros para dar destino?
O que seria da estante, sem minhas mãos frias para remexer?
O que seria do jornaleiro, sem meu trocado amolgado para pagar o cigarro?
O que seria da fotografia, sem meus olhos para reconhecer?
O que seria do rádio, sem meus ouvidos dispersos, meu sorriso involuntário?
O que seria dos meus 22 gatos pretos, se anunciassem meu corpo inativo?
O que serei, quando já não for?

domingo, 4 de outubro de 2009

Distância

A distância não tem medida.
215, 11 mil kilometros, não importa.
A distância só precisa ser grande o bastante
para impedir minha mão de tocar a tua.
O oceano Atlântico, as montanhas do teu continente,
isso tudo é irreal.
O que caracteriza a minha distância
é não ter tua pele
meticulosamente ariana
perto da minha.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

342º Dia

Já perdi a conta do tempo. Não sei mais que dia é. Sinceramente, hoje parece terça. Eu falaria que é terça, se ontem e antes de ontem também não parecessem terça-feira.
Sempre me irritei com o barulho. Mas a falta dele também me irrita.
Estou absolutamente sozinha aqui. Com quem, ou com o que, eu poderia me irritar? Não vale a pena cuspir palavras estúpidas ao único travesseiro impecável e inocente.
Ao mesmo tempo tudo é único e tudo é apenas mais uma coisa. Ainda não encontrei o sentido. Como encontrarei o sentido para o nada?
Aprendi o valor das palavras pela ausência delas. Elas vivem apenas na minha mente, ecoando tão rápido que às vezes sou obrigada a gritar “Calma! Eu não te acompanho”. E elas não me obedecem, simplesmente continuam a festejar sem dó, criando ideias impossíveis de serem executadas, sendo que eu apenas tenho o nada.